A Exposição
O
PICTORIALISMO DAS FESTAS JUNINAS EM SERGIPE
Antônio Fernando de Araújo Sá
Departamento de História
Universidade Federal de Sergipe |
Uma imagem (feita pelo homem) é uma vista que foi recriada ou
reproduzida. Uma fotografia não é um mero registro mecânico, mas
um produto da escolha do fotógrafo de uma vista entre uma
infinidade de outras vistas possíveis. Ao mesmo tempo em que o
modo de ver do fotógrafo reflete-se na sua escolha do tema, a
percepção e apreciação de uma imagem também dependem do nosso
próprio modo de ver.
Nos trabalhos dos sergipanos Cláudio Rosa Cruz e Vitor
Seabra, a fotografia aparece como meio de recordação e
documentação da vida pessoal e social, em que se revela a sua
ambígua e definitiva condição de documento/representação. Ainda
que exista uma preocupação documental de registro da cultura
popular nordestina, das festas juninas de Sergipe, esta busca
não depende de certo conformismo factual, pois as cores e os
movimentos que emergem das imagens proporcionam um rico diálogo
com as artes plásticas, especialmente com o pictorialismo. No
final do século XIX, este movimento objetivava conferir à
fotografia uma dimensão artística, próxima da pintura e da
gravura. De certa forma, os fotógrafos artistas foram acusados
de não explorarem as possibilidades estéticas proporcionadas
pela fotografia, o que atrasou o desenvolvimento da fotografia.
Por isso, ao longo do século XX, o movimento foi esquecido,
principalmente após a Primeira Guerra Mundial, com o avanço do
novo realismo fotográfico.
Mas, atualmente, a contribuição pictorialista para a história
da fotografia tem sido revista por fotógrafos e pesquisadores,
reiterando sua importância da superação da estética documental
do século XIX pela dimensão construída da fotografia, o que
abriu caminho para as experimentações modernistas.
Os trabalhos desta exposição nos proporcionam uma leitura
documental conjugada com apurada visão artística da imagem
fotográfica, resultante do amadurecimento técnico da utilização
dos recursos computacionais. Mescla de tradição e modernidade, a
intensa sensibilidade estética dos fotógrafos faz deles
observadores das sutilezas do universo junino sergipano. Como a
imagem fotográfica não é um documento da factualidade social,
mas é um documento do imaginário social, o que vemos aqui é, no
átimo do instante registrado, uma explosão de cores e movimentos
em imagens que revelam a identidade cultural sergipana. O
importante aqui é realçar que a tradição pode ser pensada como
um espaço vital da cultura por enfatizar que ela tem pouco a ver
com a mera persistência das velhas formas, mas está relacionada
às formas de associação e articulação dos elementos que devem
ser incorporados ou não a ela. Por isso, este registro
fotográfico mostra o caráter histórico e processual das
identidades locais e regionais que persistem e se (re)inventam
dentro da nova cultura global. Afinal de contas, para além da
visão conformista da cultura popular, a força das festas juninas
em terras sergipanas mostra como o campo da cultura é um campo
de batalha permanente, onde não se obtêm vitórias definitivas,
mas há sempre posições estratégicas a serem conquistadas ou
perdidas.